terça-feira, 10 de setembro de 2013

Crítica - O Mundo dos Pequeninos (2010)


A animação é simples, bela e carismática. Seus detalhes minuciosos dão a grandeza necessária à obra. Com um roteiro pouco inovador e uma pureza incontestável "O Mundo dos Pequeninos" é um filme para sonhar. Quem nunca imaginou seres minúsculos que vivem escondidos em nossas casas? A magia do minúsculo, um mundo interessante dentro de outro tão monótono. 
A trilha sonora é leve e faz a imaginação fluir, os momentos de tensão diante de algo tão comum é o diferencial da obra, e a edição de som está fantástica. As variantes invenções dos pequeninos para sobreviver "pegando emprestado" nossos alimentos e objetos é extremamente critiva. As cores, a luz, os sons minúsculos que passam despercebidos aos nossos ouvidos é uma junção artística que impressiona. O ponto fraco é o final do filme que deixa uma dúvida desconcertante - estou vendo um longa-metragem ou um episódio de alguma série? Falta o desfecho e a sensação de realização, mas nota-se que foi proposital. Na realidade, apesar da frustração, você acaba aceitando a conclusão da obra por entender sua magia e seu objetivo. O diretor Hiromasa Yonebayashi queria justamente causar essa sensação de inacabado para deixar a história viva, é como um sonho bom que termina de repente, mas suficientemente belo para ser inesquecível

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Uma Rainha sem Coroa

                     

Katheryn Elizabeth Hudson, uma intérprete estadunidense que parecia estar fadada a uma carreira anônima e de pouco reconhecimento é nada mais nada menos que Katy Perry. A cantora se tornou a única artista a ter cinco músicas de um mesmo álbum no topo do ranking da Billboard, ficando atrás apenas de Michael Jackson com "Bad". Katy fez polêmica com "I Kissed Girl" e como uma luz no fim do túnel vimos uma garota linda, com uma voz diferente, cantando música sobre beijar garotas, tudo isso embalado por um pop rock viciante. 

Katheryn era promissora, agradou adolescentes, jovens e adultos e começou a ser cogitada,futuramente, como a sucessora da rainha do pop.Porém, não foi bem assim que aconteceu. Perry viu sua imagem ser apagada com o surgimento de uma estrela promissora chamada Stefani Joanne, mais conhecida como Lady Gaga. A entrada meteórica de Gaga no cenário musical foi forte e inquestionável, com seu primeiro single "Just Dance" a cantora ficou no topo das paradas da Austrália, Canadá, Países Baixos, Irlanda, Reino Unido e Estados Unidos, e recebeu a indicação aos Grammy Awards na categoria de Melhor Gravação Dance. Todos os holofotes deixaram o palco de Katy e brilharam sobre Gaga. 

Perry estava fadada a se tornar mais uma extensão de Avril Lavigne, Pink e outras, que apesar do talento e sucesso estão fora da batalha pelo trono pop. Todavia, no mundo da música sabemos que nada é previsível, e eis que surge - Alice. Mas seus cabelos não são loiros como as outras, eles são azuis, e o país da Maravilhas é doce,colorido e com mulheres quentes se divertindo. "California Gurls" foi um estouro e recebeu a marca de 3 milhões de download digitais no ITunes, ela estava de volta, e diferente da proposta de muitas resolveu se divertir, não fez polêmica nem chocou, vestiu uma peruca azul e saiu por aí; assim conquistou o posto de primeira mulher em 53 anos a ter cinco singles consecutivos no topo das paradas de sucesso. "Teenage Dream" parecia um sonho, e como revela o nome: um sonho adolescente. Seu terceiro single "E.T." permaneceu no primeiro lugar por 52 semanas fazendo Perry entrar pra História como a primeira artista a passar um ano inteiro no top 10 da Billboard. Talvez a humilde ex-cantora gospel superasse Michael Jackson se "The One That Got Away" tivesse emplacado em primeiro, mas apesar dos esforços dos produtores o single chegou a sua máxima posição no terceiro lugar. 

Katy desafina ao vivo, fez um show mixuruca no VMA 2013, sua turnê apesar de ter recebido um ótimo retorno financeiro e de público não inovou e pra piorar tem um péssimo gosto para namorados, mas faz seu trabalho dignamente e sem muito alarde acaba quebrando recordes e fazendo dinheiro, muito dinheiro por sinal. 

A peruca foi queimada e "Roar" em 40 minutos após ser lançado já estava no topo das mais vendidas no território britânico. Com um som comercial que não saí da cabeça, e com letras de superação Katy Perry é um padrão para indústria da música, um tiro certeiro.

Por culpa dos "Hackers" "Applause" foi lançado no mesmo dia que "Roar" e Katy se viu mais uma vez ameaçada pelo meteoro Gaga, mas não foi bem isso que aconteceu, afinal, enquanto Perry ruge do topo da Billboard, Lady Gaga aplaude da sexta colocação. Agora com lançamento do novo clipe ela vem mais uma vez com uma proposta simples - vestida com folhas e flores, tipicamente perdida.Não está mais no país das Maravilhas, se encontra numa floresta e apesar de sentir o perigo permanece forte e dominante.Com seu olhar feroz subjuga o maior predador territorial e senta-se em um trono improvisado, ainda em fase de construção, mas que se estabelece pouco a pouco. Katy Perry rugiu e se fez ouvir.Aplausos!

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Crítica - O Silêncio dos Inocentes (1991)




O Silêncio dos Inocentes é o terceiro filme a ganhar prêmios Oscar nas cinco categorias mais importantes : melhor filme, melhor ator, melhor atriz,melhor diretor e melhor roteiro adaptado. O longa é uma obra de arte sem igual na história do cinema, e foi escolhido para ser preservado no National Film Registry. Dirigido por Jonathan Demme é baseado no romance de 1988 escrito por Thomas Harris, seu principal personagem é Hannibal Lecter, um pisiquiatra serial killer e canibal. Anthony Hopkins eternizou seu personagem e fez história com sua atuação, Hannibal se tornou o psicopata mais conhecido do mundo. Jodie Foster como  Clarice Starling, não só ganhou o oscar como provou que o ator é que faz o personagem e não o contrário, afinal o serial killer tinha todas as atenções voltadas para si, as chances da personagem de Foster roubar a cena eram mínimas,contudo a atriz fez uma atuação forte e convivente trazendo pela primeira vez na história do cinema dois protagonistas densos, antagônicos e em total harmonia.

Elogiar o estético da obra, suas atuações, seu roteiro cheios de nuances e sua importância não seria novidade, há centenas de criticas por aí fazendo isso. A questão mais importante é : O que faz o filme ser tão extraordinário? Por que Hannibal Lecter é tão fascinante e como podemos nos sentir em relação a isso já que se trata de um Serial Killer?

 A resposta é simples, apesar de não explicita. Nós seres humanos sempre nos surpreendemos com qualquer coisa "que foge da nossa compreensão". O mistério tende a  despertar a curiosidade isso é algo natural, porém se a coisa misteriosa vai contra princípios e sentimentos universais tudo se torna uma mistura de espanto e incredulidade. Assim acontece com os Assassinos em série. Um ser humano aparentemente normal, que paga suas contas em dias, tem um ótimo rendimento no trabalho e um bom histórico na vizinhança é isento de qualquer desconfiança, espera-se de pessoas assim pequenas falhas, comuns a todos, não algo grotesco e desumano. Duas personalidades totalmente distintas convivendo num mesmo ser, capaz do sorriso mais cativante ao crime mais hediondo é algo perturbador. Um criminoso comum é julgado pela sociedade de várias maneiras, todas com sua real sentença. Já os Seriais Killers não entram nesse julgamento, as pessoas não conseguem entender o porquê e por isso motivo eles não são postos em uma categoria de fácil entendimento e seguem em nosso consciente como fantasmas requerendo explicações. Só esses motivos já seriam suficientemente fortes para "compreender" por que nosso personagem central é o que é, contudo, falta-lhe explicar que sua personalidade é única e suas motivações talvez não sejam tão visíveis e quanto mais cruéis os crimes, mais questões surgirão diante de nós.

Na seguinte cena somos apresentados ao Hannibal Lecter : A agente do FBI Clarice Starling caminha pelo corredor de uma clínica psiquiátrica de segurança máxima, conforme passa pelas selas percebe diversos detentos, todos com uma aparência doentia e violenta, estão atrás de grades e suas celas são escuras e sujas. Quando encontra Hannibal ela se vê diante de um cárcere diferente, com vidros à prova de balas, bem iluminada, com belos desenhos na parede e um homem de aparência calma e receptiva à sua espera. Ela se encontra diante do mais temido assassino do mundo, que não só matava, como devorava suas vítimas, muitas vezes ainda vivas. Porém se nada fosse avisado a ela, com certeza esse senhor seria eliminado da sua lista de potenciais criminosos, seu semblante é de alguém que não faria mal a uma mosca e sua austeridade traz confiança imediata. Lecter possuí um olhar penetrante e um ar de riso acentuado, suas feições é de alguém que se acha superior, algo comum em psicopatas, ele parece analisar algum animal, a agente do FBI está mais para um rato de laboratório que um ser humano. O assassino em série e psiquiatra pede as credencias da mulher e percebe que está diante de uma estagiária, o que fere explicitamente seu orgulho. Somos convidados a entrar em um jogo de gato e rato, e aceitamos isso despercebidamente, para a maioria do público essa situação só ocorre quando Hannibal propõe revelar informações sobre "Bufallo Bill" em troca de detalhes pessoais agente Starling mais adiante, contudo a troca de favores já começou na cabeça do Doutor bem antes. Quando Clarice decide entregar seu formulário tem seu pedido negado, porém Hannibal lhe faz uma pergunta e quando respondida ele cede. A agente não percebeu, mas a rotina de recompensas já havia começado. Conforme era saciado ele cooperava, porém não era apenas pelo jogo, o assassino sabia que Jack Crawford (o chefe de Starling) estava usando a estagiária para conseguir se autopromover e por isso decidiu acabar com os planos do agente, fingindo entrar no seu jogo,mas usando suas próprias regras. Tudo é tão bem elaborado que Hanibbal dá pistas em forma de anagramas para Clarice, a fim de testar sua capacidade de entendimento. O jogo de toma lá dá cá não é proposto pelo Doutor verbalmente e descobrimos que para o Serial Killer seu passatempo preferido é desvendar as pessoas, saber como elas funcionam, o jogo não só traz fatos da história pessoal da agente como também revela até onde a mesma é capaz para desvendar o caso.  Ambiciosidade de Clarice é visível e isso o deixa satisfeito, como psicopatas tende a não demonstrar sentimentos, com suas indagações e reações entendemos que o assassino não está ajudando Clarice por empatia e sim por méritos próprios da agente e a cada cena do filme percebemos que ele deixa de olhá-la como uma mera experiência  e passa a aceitá-la como peça principal para seu jogo. A grande deixa do filme é não se deixar enganar.

Pulemos para a cena que eu julgo ser a mais importante: A agente revela sua principal lembrança que a atormenta até hoje, o assassino consegue enfim descobrir o trauma de infância e entender por que Starling decidiu entrar para o FBI. "Obrigado Clarice" diz o Doutor com olhos lacrimejados e uma sensação que mescla tristeza e prazer. A cena é cortada e um desenho da agente segurando um cordeiro é mostrado, Hannibal acabou de fazê-lo e o quadro simboliza Jesus (Clarice) segurando o cordeiro, atrás da imagem podemos ver algumas cruzes retratadas. Qual o significado disso? A agente é uma espécie de mártir para Hannibal? Ele vê nela a imagem da pureza, aquilo que falta a si mesmo? Tais questões são respondidas, mas como pistas desconexas deixadas pelo diretor. Hannibal pede carne de carneiro na prisão, isso significa que apesar da sua humanidade existe em si um instinto assassino incontrolável. Sua cede por sangue é saciada nas próximas cenas. No final do filme em um diálogo rápido Lecter diz: "Não tenho planos de procurá-la.O mundo é mais interessante com você nele." Podemos deduzir que o assassino ver na agente algo que falta na maioria dos humanos, um certo tipo de áurea, uma pureza rara, uma motivação nobre despojada de qualquer interesse sujo ou pretensioso. Mas aí vem outra pergunta : se os Seriais Killers são tão inescrupulosos e não criam empatia por ninguém o que impede Hannibal de assassinar Starling? A resposta é simples: sua natureza. Todo assassino em série atende a uma necessidade matando, a de "Bufallo Bill" é a cobiça. E qual é a de Lecter? O filme não revela. Como eu expliquei no início do texto, as reais motivações dessas pessoas são muitas vezes desconhecidas. O que faz um psicopata escolher alguém para saciar suas sandices é algo muitas vezes inexplicável, existe um padrão, mas muitas vezes esse padrão não segue um contexto lógico.Não era da natureza de Hannibal matar Clarice e isso não tem nada a ver com o desenho e as revelações pessoais, nem foi a empatia ou algum vínculo que o impediu, desde quando a viu na prisão ele não sentiu desejo de fazer mal algum a ela. Simplesmente não era de sua natureza.

O Silêncio dos Inocentes se tornar surpreende por mexer tão bem com situações complexas e cruéis. É um moisaico de sentimentos, questões, perplexidade e ilusão. Estamos diante de um assassino bárbaro e muitas vezes simpatizamos com ele, sua capacidade de enganar e seduzir é tão grande que torcemos para que encontrem "Buffalo Bill" e aceitamos o fato de Hannibal estar livre. Nos surpreendemos com sua crueldade e nos curvamos diante de sua sagacidade. O filme trabalha o psicológico dos personagens e distraindo o público consegue mostrar como esses monstros atingem suas vítimas. Encobrindo-as com suas doces palavras essas criaturas vão seduzindo suas presas e como uma bela água viva que dança com suas cores vibrantes, vai fascinando cada vez mais, até que você chega bem perto e decide tocá-las, afinal um animal tão bonito não pode oferecer risco. Mero engano.